17 de abril de 2008

Estranho Sedutor

A idéia de controlar o próprio destino, como fazia de fato, o deliciava. Havia em seus olhos pouca malícia, porém um necessitar, uma chama ardente que facilmente confundia os menos intuitivos.

No momento, sentado e vagueando numa mesa de jantar, observava a todos como se fossem coisas a desvendar, na verdade eram, pois poucos o conheciam e apenas aquela ao seu lado, cuja perna esquerda encostava de leve na direita dele, debatia sem dificuldade alguns pensamentos e opiniões sobre assuntos simples: o dia, a comida e a bebida.

Até que rompeu-se a realidade; girando num mundo particular, esqueceu vozes, cor e paladar, isso porque à mesa estava um desejo e desejos sempre remetem a outros desejos, principalmente aqueles não realizados, transfigurados em tristezas flutuantes que se escondem onde houver espaço, nos cantos empoeirados de uma sala, no reflexo de espelhos constantemente vistos, em abraços e rostos. Mas este veio à tona em um leve roçar acompanhado do riso da tal mulher representando felicidade ao seu lado; viviam ambos num presente inquieto e não encontravam qualquer esboço do passado em suas vidas, era nisto que ele pensava enquanto sentia-se absorvido para longe.

Adentrou em um intervalo entre horas, uma contagem invisível e só mais tarde conseguiria entender como se perdeu durante o viver alheio naquela mesa, um inferno na verdade, corroía-o por dentro toda aquela situação tentando alertá-lo da existência impermanente de todas as coisas - gargalhadas terminavam na outra ponta - e levantou-se sem um curto destino certo. Foi para onde supostamente queria ir e isso bastava simplesmente porque poderia ir a qualquer lugar. Livre, não de si, sorriu levemente nutrindo ainda o sentimento de sedução anterior ao desconforto, estava ali para alcançar alguma satisfação com a tolice das pessoas, reconhecê-las por detrás das máscaras bizarras. Esquecia porém do desgaste exigido pela tarefa, uma constante intensidade nas ações que arrebentava dor em seu prazer.

Cansou-se do vício. Até o próximo estranho sedutor sorver inquietude e ele novamente perder-se na hora do jantar.