21 de abril de 2009

Contrapesos e Marionetes

A manhã deu de presente à ela um Sol fresco e muito branco, todas as cores recebiam assim um tom mais aveludado, e as emoções humanas tornaram-se mais delicadas. Julgava os dias de outono mais felizes, porque comparados à uma peça simples e infantil, incendiavam rapidamente no ápice e terminavam num desmaio solar confortável, mas que para ela, trazia uma insegurança inquieta, um não-querer que temia o futuro muito próximo.

Caminhou por entre os objetos demasiadamente conhecidos, as falas da casa endireitada e mal empoada por entre algo que não era poeira, mas um pandemônio de tons de marrom e amarelo, como um depósito de vidas diferentes e há muito disassociadas. Sentiu-se só, ouvia os pássaros lá fora mesmo com a lembrança da noite já deposta, cozinhando um mau humor latente, provindo de um súbito abandono, um desarranjo entre os afetos.

Largou-se por cima de uma pequena mesa, derrubando um chaveiro e algumas moedas, ali tentou lembrar do que aprendera consigo mesma sobre agir espontaneamente, e não deixar-se levar pelo agrado ao outro, por uma ética que se ensina às crianças já crescidinhas; memórias suas que marcavam os atos falhos dos dias de hoje. De nada adiantou remoer as ferramentas à procura de uma segurança momentânea que lhe trouxesse fôlego só por mais uns dias, vincou-se em seu rosto a dúvida. O que fazia de errado? Como melhorar? O que deveria dizer, e como? O que a irritava? Porque agia daquela maneira e não desta? Amargou o tempo perdido... fraca e com a mente embotada de anseios não respondidos, que acabaram por liberar um veneno à própria estima.

Rodou pelo quarto duas, três vezes, abriu armários procurando a si, tentando enxergar alguma coisa ou objeto que servisse para salvar a consciência de um novo afogamento. Tal qual marionetes, movia-se controlada por lampejos de pensamentos seus, mas que não tinham qualquer marca da sua autoria. O pior era vivenciar claramente, e também sentir, o gorgolejo mental, trazendo calma e desespero em intervalos tão curtos e tão custosos.

O erro estava em dar o mesmo peso a tudo e a todos. Não colocava-se na balança, apenas avaliava. E atender ao que julgava ser mais valioso no momento tornou-se caro demais diante dos cada vez mais minguados desejos, não atendidos e tampouco trocados por equivalentes.

Horas mais tarde, sóbria, porém ainda sentindo-se desabrigada na própria pele, teve que se conter e deixar o enjoo instalado parecer natural e cômodo. Só encontrou o silêncio quando fechou as cortinas da janela e olhou a realidade lá fora como quem observa uma espectadora satisfeita na platéia. Bocejou aliviada, sabendo que naquela noite dormiria por pura e simples vontade.