29 de dezembro de 2009

Onde habita a sinceridade

Ana soube, ao abrir a estranha caixa azul que guardava no armário, o que viria pela frente. Seria a soma de todas as sensações que evitava - a felicidade de um modo geral - cercando-a por todos os lados, deixando-a sem chances para fugir, e mesmo assim estava calma.
Junto com a caixa havia um vazio evidente em seu peito, como se a caixa substituísse momentaneamente alguém que estivesse muito longe para suprir a falta. Para ela, dona da caixa e também de sua liberdade, era como uma perda de independência, pelo simples fato de estar atada emocionalmente ao outro. Sentiu-se fraca e insuportavelmente insegura, não era mais capaz de enfrentar o acaso e principalmente, não sabia como lidar com isso.

Hesitou olhar pela janela, estava sensível demais, mas encarou a mesa e os objetos ao redor, achou-os mais bonitos, coloridos, talvez mais brilhantes, quando na verdade nada tinha mudado.

Pela primeira vez, Ana admitia para si, e com muita dificuldade, que estava carente de afeto e atenção, e quase ouvindo o ritmo da sua ansiedade. Percebeu enfim que não havia como sair daquela situação sozinha, não é um trabalho solitário este que o afeto nos dá e que nos incomoda tanto; lutava contra princípios e definições muito rígidas, escolhidos e mantidos conscientemente, mas que agora vinham perdendo o lastro.

Por mais que parecesse óbvio, não conseguia resumir verbalmente seus sentimentos no puro e simples amor, seria exigir demais da sua nova empreitada pela novidade. Preferia não saber, não ter a certeza ainda, mas a única coisa que sabia, e disso não tinha dúvidas, era que, só agora, estava disposta à tentar.