Então ela disse: "Alguns acreditam que o fim é o início de algo, sempre. Afinal algo sempre começa quando outra coisa termina. Mesmo que não siga a mesma linha. Porém, outros dizem que o fim é apenas o fim. Que após ele não há um início, há apenas outra fase, outro tempo, afinal você nunca mais viverá o último segundo que se passou."
Não era um café qualquer, uma aula de filosofia corria rapidamente por ali enquanto duas peruas discutiam a venda de um apartamento. O tédio não podia se encaixar em melhor momento, mas talvez ele não estivesse afim de aparecer.
"E no que você acredita?"
"Eu acredito neste cheese cake, ele é a minha doce realidade, o resto podia pegar fogo."
Ria de uma forma meio ridícula quando fazia afirmações como essa. Não que não fosse interessante, só que aquilo fazia parte de um espetáculo mental particular, como um desses reality-shows que empobrecem o ser humano, o único objetivo nesse individualismo era a auto-afirmação. Selvagem demais pro gosto da minoria. Mas...
"Vai comprar o relógio que tanto quer agora?"
Passava os dedos avidamente envolta da garrafa de água, uma forma de chamar atenção talvez, uma dúvida, ou fúria, contida por alguma lembrança, empurrada por um alfinete da situação.
"Não, na verdade quero ir para casa, agora."
Parou. A comida tinha acabado, a água era apenas água, cigarros nem pensar. Então...
"Você nunca se contenta com a minha companhia. Não te vejo tem três, três semanas."
"Quando falei casa, estava me referindo à sua casa."
Engoliu, mas não estava satisfeita. Não acreditava totalmente naquilo, silêncio. Talheres batiam ainda na louça por todos os lados. No vidro, onde não haviam reflexos, um trinco aumentava à cada dia.
"Voltou a pensar no plural? Tem quanto tempo agora? Cinco anos?"
"Seis. Mas isso não importa. Podemos ir agora?"
A conta já estava paga desde o início. Era incômodo ter que esperar uma confirmação para se levantar.
"Está chovendo. Trouxe o seu guarda-chuva?"
"Sim."
Foi no táxi. No táxi que perdeu as chaves de casa, as chaves dela.