19 de março de 2008

No Chafariz

No próprio labirinto permitia-se correr, mas não estaria indo longe demais? Desconcentrada, sem posses ou preocupações, afagos vagos, sobreviveria?

O peso da moral, da família, da onipresença; para onde foram todos aqueles que sorriam?

Temia o desmoronamento de seus princípios, sempre tão difíceis de manter, intactos, brilhantes no distante intocado de si, bem ali onde ninguém atingia. Mentira, claro. Todos conseguiam trilhar os atalhos até o pequeno paraíso, começava pelo básico e ía até o profundo; do nada que separa tudo até a alma inconsistente, apanhada num súbito envolvimento; desleixo, descompasso, é a pura sedução. Todo corpo derrete-se em desejos até que só reste uma massa sólida de amargura, que não possui qualquer mel ou licor, é apenas caroço estéril; estava seca. Seca de sentimentos, dor, felicidade ou qualquer coisa que gerasse calor ou frio, vivia sempre um único dia porque este existia internamente; sabe-se que o infinito habita em cada um, pois era nesse eterno hiato, entre respirar e cessar, que jogara todas as suas âncoras.

Agora o conflito. Lembrava-se do passado como quem observa o filtro usado de um cigarro; detalhes comuns, filmes repetidos, noites mal dormidas, todos aqueles pequenos feitos tão mais memoráveis que os grandes; enfim, o normal. Mas veio a onda; a praia, o barco, as flores, nada disso importava, marcou-se a onda.

Louca; perdeu-se na memória, revolvia como água, estacou o desespero, lágrimas, vítima da própria inconclusão, recostou onde podia, 'onde' era público; olhos. Como vivia no presente? Quem era a nova figura em que transmutara-se, porque não ía além? Para onde direcionar a culpa?

Derramou-se no chafariz, na verdade ninguém se importava, o dia era sempre o mesmo, mas através do vidro um pouco distante, e pronto para retomar o movimento, ela encontrou um olhar, e nele havia o par da sua lágrima esquerda.

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