16 de agosto de 2008

Canhedo Público

A vida não pode ser simplesmente esquecida; não se pode apagar uma história.
Em nossas inquietas mentes habitam as noites, os dias, as vozes esquecidas anos antes. E com elas imagens, fotografias, sequências inteiras das manhãs de uma época; não há corretivo que suprima aquelas palavras trocadas entre os seres.

E vejam além dos sorrisos dos quadros, o horror do artista ao cobrir com o veneno da sua arte, seja ela líquida ou corpórea, uma outra etapa, um outro esboço de um querer.
Ardem ainda em muitos corações as brasas de um teste; vivem ainda muitas pessoas em seus jardins encantados. Seus segredos e suas memórias. Seu único conforto diante da realidade bruta e carnívora que lhe arranca os minutos no ônibus, num banho longo.

Mas eis o passado envidraçado, posto atrás dos olhos; um homem velho ou uma jovem senhora, suas marcas, seus odores, seus aniversários são todos os amigos e inimigos, são a família e os desconhecidos. São colina ao vento; e os sinais deixados em casas, as marcas em bancos ou árvores, a fortuna de um pequeno nas páginas emboloradas, lotadas de desejos e ansiedades de um terceiro;

Vem a catarse, o estranho à porta, e sentí-lo agora é diferente, são outras vidas no mesmo chão, na mesma cama. São rio e lava ressequidos, transformados.
A mulher distante, o jovem garoto; agora sério, agora mística; o casal separado, os irmãos de mesma ninhada, o ódio e o amor, incapazes de reagirem entre si, geram instinto, embaraço, é uma fantasia.

Em algum lugar jorra água de fontes frescas, em outro apodrece a carcaça jovem de um rato, mas ninguém verá; ficam aqui, entre estranhas palavras, segredos, verdades e ilusões de algum tempo que logo ninguém irá lembrar. Vive-se à cada hora um mistério.
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este post é dedicado à Jana Cambuí por suas recomendações ao blog. E ela pode ser lida em O Infinito Público.

5 comentários:

no disse...

Ótimo texto.

O passado sempre vem jorrar pra fora da gente, como borboletras que hibernam, beibe, e acordam um dia, só pra gente se tocar que tem que seguir em frente.
A gente tem que alimentar bem as borboletras, pra que elas não apodreçam e fiquem amargas no nosso estômago.
Não morrem nunca, as marcas das borboletras que não foram bem adestradas. Portanto, façamos bem do nosso passado, que ele só vai ter a nos provar que estava certo.


Cara, teus textos são geniais, e os temas, riquíssimos. Tô te linkando no meu, se quiser me linkar também:

http://caleidopizza.blogspot.com


=*

Unknown disse...

nossa, realmente um otimo texto.
você escreve bem *;

Unknown disse...

Meu caro, parabéns!!!
Texto profundo... de uma profundidade esquecida em tempos, digamos, "enlouquedidos" rsrsrs
Gosto muito deste estilo "ping & pong", remeter os pensamentos para aqui e ali/acolá...
Novamente... Parabéns...

Muito boa a referência dada a Jana Cambuí... Ótima escritora!

Quando puder, visite-nos em http://vinitn.spaces.live.com

Sucesso!!!

Jana Cambuí disse...

Julio, não sei se um simples "Muito Obrigada" valem o texto perfeito. Mas que fique claro que fiquei realmente tocada, vendo personagens e sentimentos (meus ou não) caminharem assim por essas suas linhas, como numa dança gostosa.
Beijo!

Anônimo disse...

neste mundo enlouquecido que assistimos, de fora ou de dentro de nós, tudo muda muito rápido, tudo vira passado sem ter sido suficiente presente. Somos o que sentimos, o que pensamos, o que vemos, o que imaginamos?