O gotejo fraco em massa batia e acumulava-se.
Estando ela ali, estática, a observar da porta a fraca chuva que caía, também não conseguia compreender a precipitação dos seus pensamentos. Provinham da mesma fonte e, aos olhos inquietos da mente, pareciam muito iguais; temores ou alegrias, todos translúcidos com suas imagens borradas na parte de dentro. - Estava louca? - Aguardava ainda as crianças terminarem de se aprontar, mas não estava atenta, chovia e ela observava.
Nada naquela tarde foi muito diferente. Dedicou-se ao trabalho e agora teria de dedicar-se aos filhos. Era uma obrigação. Minutos antes já mantinha esse sentimento impuro sobre eles, simplesmente não estava afim de sair naquela tarde, naquela chuva, para levar os filhos às ocupações do dia. - Deixá-los em casa seria pior. - O problema estava escorrendo dos céus, essa era a verdade, mas vinha acompanhado da data em si.
Um ano antes, precisamente, também chovia. Porém, a mulher sob o arco da porta, ela mesma, era outra; e também não nutria mágoas-fagulhas pelos filhos. Mas naquele dia estava livre de alguma maneira de si mesma, da personagem que absorvera com o passar dos meses.
Teve um caso - um momento, um dia, horas apenas - com o homem que lhe lembrava absolutamente todos os anteriores, mesmo não sendo muitos. Era um estranho e tornou-se adultério, simples e casual. Nunca se arrependera. Pensava sobre isso, enquanto encarava a água das poças tremulando com mais e mais gotas que caíam.
Ainda tinha o número do telefone.
Os filhos nunca entenderam direito - mesmo antes de esquecerem o episódio anos mais tarde - o dia em que a mãe simplesmente não os levou para alguma aula e saiu sozinha, voltando para casa apenas no dia seguinte. Sabiam apenas que isso fora o marco do divórcio de seus pais.
Ela nunca se arrependeu dos dias de chuva.