Deixou-se acordar aos poucos; vivera uma realidade recente, daquelas que são como sonhos intrigantes e bons, mas amedontradores ao final. (o pé esbarrou num copo d'água, ninguém se importaria)
Havia um peso em seus olhos, mas não provocado por sono. Um gosto de cobre à boca entreaberta, preparada para um suspiro, que veio sôfrego fazendo-o sentar-se novamente.
Era uma manhã peçonhenta, um dia facilmente rotulável de lindo, mas que escondia nos solitários uma estranha ausência, por vezes vinda da noite anterior, e sempre atribuída aos afetos. Quer fosse a mãe, para os pequenos, ou o amante para os jovens inquietos em seus quartos descombinados. Para ele não era uma coisa nem outra, sentia uma falta, egoísta, de si, antes de culpar as figuras alheias.
Neste momento, outro também levanta-se de olhos bem abertos, e ao sair da posição emborcada, sentiu as palavras não ditas moverem-se dentro da garganta, como uma rolha que boia dentro da garrafa de vinho. É um gargalo estreito o dos sentimentos. Teme-se muito mais do que se ama; poucos conseguem manejar esta válvula que é o coração junto com o cérebro e a língua. Um sibilo, uma lágrima, um olhar, podem ser interpretados e lançados de diferentes maneiras.
Relembrou e defendeu sua atitude inexpressiva quando viu-se no espelho e secou o rosto com uma toalha já úmida. Precisou ficar sozinho, avaliaria o passo dado sem fomentar segurança, pois não se sentia seguro. Ainda que isso gerasse um desconforto doloroso ao outro, e sabia muito bem que isso aconteceria, não poderia ter feito outra coisa.
O primeiro não respirava. Engolia faminto o ar pela boca em busca de lucidez, ou minutos de traquilidade, mas ainda passaria por um estado de tempestade, sozinho, após um tempo debaixo do Sol morno. Pensaria melhor quando a tarde chegasse ao fim.
Ambos carregavam um brilho nos olhos, de choro ou dúvida, e desafogaram-se na distração vaga do lazer, retirando assim o foco do desassossego. Foi quando aprenderam a ter calma e, talvez, mais cuidado com as doses de incerteza e silêncio.