Eu ia comprar flores. Eu ia à feira escolher o peixe, dançar entre as barracas, encantada pelas listras laranjas e brancas, eu ia dedilhar as caixas de morango, e pediria ao seu Pedro: bom dia, seu Pedro! Hoje vai chover? - e ele me diria que não, para sustentar o meu sorriso. Eu ia, mulher desembestada, entre tantas outras, fedendo a gente, empoada com uma sacola biodegradável, estampada de verde e amarelo, eu a lotaria com meu prazer de escolha, entre os múltiplos frutos, legumes frescos; eu também dentaria um pastel. E vestida com aquela saia velha da minha mãe, eu estaria satisfeita, encontraria em mim outra vez a menina que fui, circulando de mão agarrada à uma saia igual àquela, vendo outras meninas, medrosas e chiliquentas; vendo agora outras mulheres, temerosas de amor, desiludidas, enfraquecidas já ao Sol da manhã, mas não eu, forte e corada, desejando apenas viver os momentos, saíria por cima das tensas mentes na feira.
Eu ia unir assim nós dois à mesa, em uma quinta comum, desimportante, mas que eu marcaria com o almoço, feito para acordar-te, nu e silencioso nos meus lençóis, um milagre sob meu teto; eu chamaria teu nome ao pé do ouvido, indiscreta e docemente. Tu então me erguerias sobre a vontade, sorriríamos.
E a mágica do som dos talheres justificaria meu afeto, com o sabor da noite anterior ainda presente em nossas mentes; nosso silêncio acabaria em despedida, eu sincera, tu feliz.
Eu ia agarrar-me aos travesseiros, girar por cima deles, envolvida em memórias de algodão, vermelho-opaco; a princípio muda ao ver-te recostado na porta, eu ia dizer: eu te amo; um calafrio me subiria a espinha, e tu dirias: eu te amo. Como nas outras vezes, fazendo um melhor compasso do meu dia, nós seríamos nós, e mais.
Desejando assim, eu fui.