achava muito apropriado que a tromba d'água viesse num momento como aquele, estava até mesmo satisfeita pois o acaso da natureza casava perfeitamente com seus fetiches de meio de tarde; mas estava correta, reta, o queixo pronunciado, limitada em sua função, presa numa crisálida de rotinas e horários: hoje teria meia hora, amanhã e depois - por Deus, até mesmo depois de depois de amanhã! - centraria os esforços em manter o "não há nada de errado" em seu próprio ninho; mas que maldade me fazer esperar tanto tempo, pensou, agitada, frenética, não era mulher de respirar pela boca por homem nenhum, muito menos por garoto;
ele veio, meio torto em suas pernas suadas e tênis coloridos, sem anseio; cheguei, e desviou os olhos pro lado feito um cachorro, procurou as palavras, mas ela tinha pressa, ela tinha necessidades e horários; já estava só de relógio, escrava das próprias enrascadas - desde sempre, desde pequena e burra a esquecer as bonecas por aí, e lembrá-las sem mágoa, perda reparável - comeu-o por inteiro, esparramou-o pela mesa, faminta de si em perigo, mas completamente ausente de conservadorismos que - é verdade - às vezes tinha.
cúmplice, a chuva virou enxurrada, ensurdeceu as paredes, transbordou os minutos e cantou os trovões junto aos sussurros daquela coisa toda que acontecia; e quando veio o silêncio, ventou uma brisa muito fresca, talvez a mais fresca daquele dia, gelando no corpo o suor que já secava dentro das meias e do vestido; nos falamos depois, sim, um beijo e estavam outra vez esticados pela corda longa da rotina.
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