18 de janeiro de 2008

Alice

Alice dedicava-se à leitura agora, à leitura e ao calor morno; palavras de um livro eram mais livres que as faladas, saídas de bocas, presas à mente. A mão apenas transcreve direto sem o filtro do som, sem o confronto do olho humano. Alice não tinha mais vícios, pois a vida a ocupava além da conta, da liberdade tátil de copos ou fumo, estava plena de si, viciada nos próprios sentimentos, louca-serena; um anjo de asas alvas intrigado com os pecados humanos; estes tão vastos quanto florzinhas amarelas no campo de viço verde.

Mas Alice só podia agora acalmar-se com personagens que só vivem em pensamentos, só encarnam na mente alheia, sem ela são apenas fruto vazio da inspiração; apenas nomes e angústias e desejos no papel. Ela era isso, sentia viver como eles (esses nomes), não como heroína, não; heróis são tolos demais, perfeitos demais, não possuem o que é mais apaixonante na vida real: o cotidiano, a mesmice, a vida como ela é; mesmo quando o têm, é repleto de falsidade, e Alice reconhecia seus comuns no papel quando via todas as coisas juntas, toda a desordem existente; ora interna em conflitos e paixões, ora externa no barulho e no silêncio, seja das vozes (essas nunca mudas), seja em fatos, nos movimentos alheios a nós.

Saudade é uma palavra única, e ela compreendia seu sentido quando tocava os próprios lábios, ou quando deitava-se tarde com um livro.

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