13 de julho de 2011

O Salão dos Afetos

Eu tinha as chaves do salão dentro do meu bolso, mas as portas estavam abertas, e ali - em meio à luz empoeirada daquela manhã - eu juntei as últimas memórias espalhadas em um canto qualquer. Não eram muitas, apenas pequenas coisas brilhantes, como estrelinhas de final de festa ou pedaços de balões. Foi o eco dos meus passos que me fez parar um pouco e observar o vazio.

Lembro bem do chão de taco coberto de sinteco novinho, das paredes cor de pérola e da sanca percorrendo todo o teto, um detalhe que acrescentei na estrutura que depois - e aqui sorrio - foi uma feliz coincidência. Era um enorme salão, não de forma opressiva, mas como uma caixa de presente grande feita de concreto: as cortinas desciam como fitas nas janelas, e pouco a pouco, eu fui preenchendo os espaços com sentimentos coloridos, lustrando-os de esperança sempre que achava necessário e nunca esquecendo de manter a desordem num nível saudável.

Não sei bem qual foi o meu erro, provavelmente nenhum, mas ali eu coloquei também um espelho na parede oposta às janelas, de forma que se fosse necessário encarar a minha posição em meio a tudo aquilo eu pudesse também ter a certeza de que mantive as cortinas abertas. Minha surpresa veio algum tempo depois, quando a exigência do convidado caiu sobre todas as coisas ali dispostas: as cortinas deveriam permanecer cerradas. E num espanto percebi que não seria possível ver o que eu colocara ali, com tanto cuidado, da forma como eu imaginava. Por mais que eu jogasse luz sobre os atos, sobre os objetos e todas as memórias, nada brilhava sob a lâmpada artificial de um desejo contido. Perdi, inclusive, minha referência no reflexo do espelho, e com isto perdi-me em momentos - tantos - que não entendia por não conseguir vê-los, nus, despojados de sombras e medos.

Quando alcancei as cortinas e forcei o Sol para dentro do salão, encontrei nele o silêncio. E vi no reflexo a perda em meus olhos; e deles ela escorreu para o chão mofando os últimos afetos.

Incapaz de reverter o processo, abandonei à própria sorte o espaço que demorei mais tempo para construir sobre o cotidiano de todos os pensamentos. E de refúgio seguro à abrigo inútil de mágoas severas, este lugar perdeu o contexto de si próprio.

Há no espelho um imenso pano branco que aos poucos amarela e, ainda hoje, retirei as cortinas dos trilhos; deixei a chave em algum lugar ali dentro, mas não sei onde e não pretendo encontrá-la. Ainda é cedo, mas já começo a tirar as portas e, quando der, construo na entrada uma nova parede.

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