21 de fevereiro de 2012

cadáver

Despertaram todas as formigas numa noite de verão e lua cheia; operárias silenciosas, pequenas e ligeiras, buscavam o cheiro doce do cadáver na grama. E morto estava, esfriando aos poucos, perdendo o viço e a cor, numa estranha metamorfose sem brilho. Vivia como uma ilusão: de outras coisas muito menores que acabariam por terminar o que terminado estava.

Vazou-lhe a alma pela boca entreaberta, escorreu-lhe a água suja e humana de suas experiências e, aos poucos, afundou nas próprias entranhas. Quando já não havia mais luz e apenas algumas estrelas eram testemunhas do seu detrimento, a penumbra o transformou em definitivo para que o Sol não mais o reconhecesse e nem curvasse sobre ele o carinho da manhã.

Estranho os outros acreditarem que ali estava um destino selado, como se fossem livres para percorrer o caminho das escolhas; chegavam sempre ao lugar da onde aparentemente saíam.

Dentre todas as partes, as formigas descartaram as unhas, os pêlos e os olhos - estavam abertos e refletiam a luz como um par de falsos brilhantes.

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