22 de fevereiro de 2008

O Rapaz e a Vida

Desconhecia o poder das palavras diretas, únicas e seguras. Sentia o medo cozinhar logo abaixo do estômago, subia-lhe e tirava-lhe o fôlego.

Quando absorto sob o Sol, observava de lado a cicatriz, era marca, logo significava. A cicatriz, pura metáfora entenda bem, não mais incomodava, pois corte não era, obviamente. Porém, ainda significava.

E havia tanta coisa, a vida tomou-lhe a tapas a insegurança e arrumou, como uma grande mãe protetora, seu uniforme, seu padrão embaçado, uma mistura de ingenuidade e frescor, algo assim, mais ainda deu ao insólito rapaz algumas razões, uma certa falta de arrependimentos e capacidade múltipla. Para o recomeço, estava ótimo.

Porta à fora o dia raiava, em cada pedra, cada planta, o destino incerto parecia um mundo encantado, Alice invejaria aquele sentimento se fosse real, mas seria ele, agora também, apenas fantasia? Não se perguntava; a questão viria mais tarde dos outros, muito natural, estaria preparado para isso.
Sobre as próprias pernas era Rei, e reinaria por espontaneidade, por ter nascido para isso, para a sua vida, e pela ambulância de seu reino na vida dos outros.
Num novo dia de deslumbre deu-se conta de algo de antes. Então a vida correu, jogou-lhe todas as distrações possíveis, ergueu muros envolta de todos os pensamentos, enxotou cada praga do jardim das delícias, e achou que estava tudo resolvido. Mas a vida não podia deter o choque, o rebalanço do universo, o grande e egocêntrico Destino logo veio serelepe, ironizando a pobre vida, desolada e aflita, teve que usar o único remédio que também era veneno: a caixa de lembranças.

Neste dia, o insólito rapaz caminhava e relembrou por culpa das palavras, e quase sentiu que o corte se reabrira, viu nitidamente a causa. Estranhamente, não deixou-se amargurar. Ele apenas apoiou-se no que podia e seguiu.

A vida, apesar de receosa, endireitou-se após o abalo das lembranças. Era preciso conviver com elas.

6 comentários:

Anônimo disse...

...gostaria de fugir do obvio, mas não tem como...
me perdoe...
voltarei,

Artur Quintanilha disse...

Lembranças tem duas faces: a boa e a ruim. Adoro relembrar a boa face, mas não consigo deixar de pensar na ruim. Tento, tento, mas é inevitável. E o destino parece que foi feito pra ajudar o face ruim.

Jana Cambuí disse...

Perfeito. Impecável até o final teu texto. Aliás, pelo que pude ver, todos os teus textos são muito bons. Descobri sem querer teu blog numa das comunidades do orkut. Taí, gostei, vou por nos meus favoritos e voltar mais vezes.

Anônimo disse...

sem palavras para definir teu texto. gostei... gostei mesmo... bem limpo, profundo, às vezes até incomoda. entenda, isso é bom!! achei teu blog por acaso... e acho que volto assim por acaso também.

moa disse...

ah, tá até ficando chato. o mais divertido é que vc é meu amigo.
te amo!

Géssica disse...

Andei vendo seus textos e os achei fabulosos...